segunda-feira, 29 de novembro de 2010

FICHA LIMPA

O ex candidato a vice-presidente, Índio da Costa, fala sobre o desinteresse dos jovens pela política. Diz como foi a elaboração do projeto de lei que mais se debateu nestas eleições, e comenta sobre sua integração com as redes sociais

por Netto Jordão

Índio da Costa é formado em Direito pela Universidade Candido Mendes, Ipanema, e pós graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autor do livro A Reforma do Poder e entrou para a política em 1996, participando do governo de Cesar Maia na prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

Foi vereador no Rio de Janeiro entre 1997 e 2007. Em 2001, integrou a Secretaria Municipal de Administração do Rio de Janeiro. Já 2006, foi eleito deputado federal, assumindo no ano seguinte. Na Câmara dos Deputados, fez parte da equipe da CPMI dos Cartões Corporativos.

Em 2010, Índio da Costa foi convidado pelo ex candidato a Presidência da República, José Serra, do PSDB. Contrariando as pesquisas de intenção de voto, Índio e Serra foram para o segundo turno, mas foram superados pela candidata do PT, Dilma Rousseff.

1 – Como é ser político em um país onde reina a corrupção e a impunidade?

Muitas vezes desanimo. Por isso fui relator do Ficha Limpa, Lei que criou regras para afastar de cargos eletivos pessoas condenadas por grau colegiado. Poucos acreditavam, mas foi possível e valerá para 2010.

2 – Há como reverter o estereótipo de que todo político é ladrão? Como? A maioria dos políticos é de gente séria e a população sabe distinguir. Tem uma faixa do eleitorado que vota sem saber por que e em quem. Outra faixa reclama, mas não participa. Esse processo se reverte com cultura e educação.

3 – Você é a favor da descriminalização da maconha? Por quê?

As drogas aumentam muito o custo da saúde pública. O problema é muito mais complexo que fumar ou não maconha.

4 – Em sua opinião, qual fator foi determinante para o que o Ficha Limpa fosse sancionado?

Os líderes do Governo na Câmara e no Senado –deputado Vacarezza/PT e Senador Romero Jucá/PMDB- disseram claramente na TV que o Ficha Limpa não era prioridade deste governo. Falavam a verdade e atrapalharam o que puderam na tramitação do projeto de lei. No entanto, há um grupo parlamentar sintonizado com a população e que se interessa por qualificar a vida pública no País. A pressão popular nos deu condições de crescermos sobre os corruptos e os que cometem crimes eleitorais para se elegerem. Ser um ano eleitoral nos ajudou a pressionar os partidos aliados do governo e o presidente Lula.

5 – Você foi o relator do projeto Ficha Limpa. Como foi o tramite deste processo até sua aprovação como lei?

Ninguém queria assumir a relatoria porque as propostas que restringem direitos de quem tem mandato são impopulares entre os políticos. Minha tarefa como relator do Ficha Limpa foi analisar doze projetos de lei similares, que havia no Congresso desde 1993 e juntá-las em um único texto, que tivesse maioria dos votos internamente para ser aprovado. O texto base foi o apelidado de Ficha Limpa de iniciativa popular. Houve momentos de muita dificuldade. A imprensa e as redes sociais ajudaram muito! Por conta deste debate, meu Twitter pulou de 1.5 mil para mais de 26 mil seguidores, de todo o Brasil. Meu site que tinha 46 mil pessoas cadastradas pulou para quase 100 mil. Todos em busca de informações sobre o projeto. Respondi cada email que recebi. Diferentes Orkut e Facebook foram criados para nos dar apoio. Entrevistado pelo Jô Soares, dei o número do meu celular no ar e isso me permitiu ter contato com cerca de 2 mil brasileiros em poucos dias. Uma verdadeira loucura, mas que tinha um propósito. Aproveitei o contato por celular e sms para montar uma guerrilha. Na dia da votação do Ficha Limpa, eu tinha apoio de 2 mil voluntários de todo o Brasil, que me seguia pelo Twitter e ligava para os celulares dos deputados federais que imaginávamos que seriam contra. Enfim, foi um processo intenso de 3 meses desde que assumi a relatoria até aprovação na Câmara e em seguida no Senado. Em geral, um projeto de lei como este não é aprovado. E quando o é leva cerce de 10 anos. Graças à sociedade participativa conseguimos avançar!

6 – Como é a elaboração de um Projeto de Lei? Que aspectos devem ser levados em consideração?

O Ficha Limpa foi elaborado por um juiz eleitoral e proposto por uma ONG chamada Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral. Os aspectos mais importantes são a constitucionalidade, juridicidade e o mérito (o que está sendo proposto de fato).

7 – Fale um pouco sobre o projeto de lei proposto pelo senhor, que estabelece a publicação do TSE em seu site, dos antecedentes criminais de determinado candidato

Esse meu projeto de lei foi derrubado na Comissão de Constituição e Justiça pelo deputado José Genuíno do PT. Não me acostumei com a idéia e enviei o texto ao TSE. Dois meses depois o presidente do Tribunal Superior Eleitoral publicou uma resolução definindo que o site oficial do TSE publicará os antecedentes criminais de cada candidato, mesmo antes de termos aprovado o Ficha Limpa e já para as próximas eleições. A idéia é oferecer transparência e informações de cada candidato ao eleitor na hora de escolher seus candidatos.

8 – O senhor possui um projeto que visa cassar os benefícios de um criminoso que cumpre a pena (menor que dois anos) em liberdade sem seguir rigorosamente as imposições feitas pelo juiz. Entretanto, o índice de criminosos que não voltam para as prisões após a liberdade condicional é alto. Qual a relevância deste projeto? Não seria mais viável acabar com a liberdade condicional?

Sou favorável às algemas eletrônicas para acompanhar os criminosos em liberdade condicional e muito rigor para que não saiam do que foi estabelecido pelo juiz.

9 – O senhor é a favor de que câmeras de vigilância sejam instaladas em salas de aula para monitorar crianças de até seis anos de idade? Importante para evitar a pedofilia entre outros problemas.

10 – O presidente Lula obteve, em seu mandato, percentuais recordes de aprovação da população em sua gestão. O projeto Ficha Limpa mobilizou mais de 4 milhões de pessoas. Você acredita que a população está mais “íntima” dos políticos e mais participativa na sociedade nos dias de hoje? Como isso pode beneficiar o país?

A ditadura afastou toda uma geração da política. Finalmente voltamos à democracia que prevê a participação da população permanentemente. As redes sociais atraem os jovens para a política, e estamos voltando ao tempo em que a política era feita com idéias e propostas; não com dinheiro.

11 – Como avalia a gestão do Presidente Lula?

Tenho respeito pelo presidente Lula. Acredito que ele deseja fazer o melhor para o Brasil. Como todo político quer entrar para a história como alguém que fez diferença, ajudou as pessoas que mais precisavam. No entanto, pelo que vejo o Brasil levará décadas para reintegrar à sociedade as pessoas que se tornaram dependentes do Estado. Os beneficiados destas bolsas família, gás, geladeira, etc não estão vinculadas à nenhum mérito ou esforço. Recebem porque são pobres e estão proibidos de trabalhar. O estado do Bem Estar foi criado para garantir apoio e não dependência. Infelizmente, as bolsas não são instrumentos de integração social como deveriam ser. Quem assina carteira perde o benefício e muitos entendem que a bolsa é um direito garantido e não um apoio temporário. Nenhum esforço foi feito pelo atual governo para que estas pessoas deixem de depender do governo e é por isso que os impostos só tendem a subir. São poucos produzindo e muitos dependendo. Um erro. Uma maldade, pois a liberdade só existe quando se é capaz de pagar suas próprias contas e não ficar dependente dos governos A ou B. Melhor seria oferecer uma espécie de bolsa conteúdo para que estas pessoas tenham apoio financeiro para sair da miséria, e não se tornar dependente de esmola estatal. O outro programa é o PAC; esse não chegou nem na metade do prometido.

12 – Pretende se candidatar à Presidência da República futuramente? Presidência da República é destino, não vontade pessoal. Se não me engano essa frase é do Tancredo. Concordo.

13 – Qual seu sonho como político?

Nossa, são muitos! Sonho em contribuir para livrar o mundo e o Brasil da dependência do petróleo, que além de não ser renovável contribui com o aquecimento global. Sonho em desenvolver modelos racionais de recuperação ecológica para compensar o estrago feito. Sonho em reduzir impostos e ampliar a eficiência e eficácia da máquina pública no Brasil, provei que é possível reduzir o custeio da burocracia quando fui secretário municipal de administração. Sonho em tornar o Rio um lugar seguro para se viver e isso vai muito além das promissoras UPPs. Sonho que as filas dos hospitais virem algo do passado, com acesso à saúde preventiva para todos. Sonho que a universalização da educação seja acompanhada de qualidade e não apenas de mais vagas para embromar as crianças e seus pais. Sonho que a educação de 1º e 2º graus adotem o ensino profissionalizante em todas as suas escolas. Sonho que as creches públicas deixem de ser depositório de crianças e passem a educá-las. Sonho que os corruptos sejam punidos e não protegidos por quem tem poder para julgá-los. Sobretudo sonho que a forma de se fazer política seja cada vez mais democrática e transparente.

14 – Qual sua maior alegria e tristeza na carreira política?

A maior alegria foi ter aprovado o Ficha Limpa. A maior tristeza foi o meu partido ter vetado minha candidatura a prefeito em 2008.

15 - Como a Educação em nosso país poderia melhorar?
Investindo pesado no ensino fundamental, na alfabetização e aproximando as matérias ensinadas da realidade do mercado. O MEC peca quando define um currículo desatualizado. Passamos do mundo analógico!

16 - - Uma frase?!
Não corra em busca de seus objetivos, apenas vá na direção certa que você chega lá. Para isso, duas palavras: Fé e Foco!


17 – Que recado deixaria para seus futuros eleitores?

Quando as pessoas de bem se afastam da política os corruptos aumentam seu poder. Quem compra voto se beneficia do vácuo deixado por eleitores que votem em qualquer candidato em troca de cerveja ou churrasco. O voto nulo contribui para eleger aliados de bandidos de toda espécie.


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